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Sônia e Célia

Transcrição das Palestras de Sônia Guajajara e Célia Xakriabá

Indigenous Women on the Front Lines of Climate Activism: The Battle for Environmental Justice
in the Amazon

2:20 – 11:00 — transcrita por Sara Shuler e Em Tejada Jaquez

Eu consegui cantar porque eu acho que o ar condicionado me deixou meio, mas é uma forma de nunca falar sozinha, principalmente o canto na verdade foi a principal arma que não permitiu que os povos indígenas fossem  exterminados no Brasil. Eu sou Célia Xakriabá, venho da região do bioma do Cerrado. É importante também reconhecer que não apenas Amazônia hoje está sob a mira do

O ecocídio, mas também o Cerrado que é o segundo maior bioma do Brasil, e hoje 90% da soja que é exportado do Brasil também vem da região do Cerrado, então pra compreender o fogo criminoso que acontece na Amazônia é precisa-se compreender que esse fogo é o que historicamente queima o bioma Cerrado. É o mesmo fogo também que queimam as casas de reza indígenas Guarani, também esse fogo que historicamente queimou e também estuprou os corpos das mulheres indígenas. Eu venho do bioma do Cerrado e todas as vezes as pessoas perguntam por que que nós fazemos essa luta no exterior, e nós perguntamos, “O que vocês fariam se sua mãe estivesse sendo arrancada?” O que vocês fariam se estivesse sendo  arrancado  o direito de viver, não apenas a sua morada coletiva, mas principalmente da sua morada interior que é o território.

Todos os territórios indígenas no Brasil que nós conhecemos só foi demarcado depois da morte e da execução  de algumas lideranças indígenas. No território Xakriabá não é diferente. Como nós vivemos numa região no bioma do Cerrado, em ’87, o território só foi demarcado depois do crime contra uma liderança Xakriabá e que foi o primeiro crime reconhecido como genocídio indígena no Brasil. Mas o território Xakriabá só foi  demarcado um terço do território originário e todas as vezes hoje quando a população pergunta pras mulheres e principalmente a juventude, fala, “Vocês são Xakriabá? Vocês sabem nadar? Vocês vivem do rio? Vocês vivem da pesca?”,  E a maioria da  juventude diz  que não porque, essa ausência do rio, nós comparamos como se fosse um filho que é retirado de amamentar  no peito da mãe, no aleitamento materno.. Nós podemos crescer, mas nós crescemos contrário, e eu falo que a juventude, as crianças só não afogou no rio, porque foi ausência, daquilo que nós não vivemos no rio, que nos afogou (?). É importante dizer isso porque quando a gente fala de mudanças climática, a contribuição das mulheres indígenas para redução a velocidade das mudanças climática, eu falo que muito pior do que a mudança climática, exatamente a velocidade com que está acontecendo a mudança climática.

E meu avô disse que essa luta nossa, as pessoas falam que não tem muito tempo, então as pessoas têm reproduzido a fala que a luta pelo não aceleramento  das mudanças climáticas, é uma luta contra tempo. E meu avô disse que não exatamente uma luta contra tempo, é uma luta pela retomada do tempo, porque exatamente essa noção da velocidade do tempo que faz o aceleramento também do capitalismo. Então, quando hoje nós povos indígenas representamos uma ameaça pro governo, tanto governo brasileiro, governo Bolsonaro, mas tanto pro capitalismo, é porque nós apresentamos uma real possibilidade de vida que não é controlada pelo tempo. Então quando nós também questionamos  esse capitalismo e constantemente no congresso nacional no Brasil, somos questionados pelos deputados da bancada ruralista que diz, “Por que vocês povos indígenas são tão contra o capitalismo?” e eu falo a pergunta é o contrário, assim a resposta também: “Por que que a bancada ruralista e o capitalismo é tão contra os povos indígenas?” Porque não necessariamente nós representamos uma ameaça pro capitalismo e para as mudanças climáticas.  Pelo contrário; o capitalismo e a mudança climática representa um eminente ameaça para os povos indígenas e para a humanidade.

E pensando nesse capitalismo, eu fico também refletindo sobre a monocultura. Quando a gente pensa, por que é o consenso para todo mundo que uma comida saudável é aquela que tem diversidade na mesa, é aquela que tem cor também? E por que as pessoas não pensam ou refletem que uma sociedade saudável é aquela também que tem diversidade? Porque se fala que na monocultura, assim como na minha região é ameaçada pela plantação do eucalipto; e se  a gente diz que na monocultura do eucalipto possivelmente não vá sobreviver nem formiga.

Eu fico pensando se numa sociedade em que não existe diversidade, também vai sobreviver com a monocultura de corpos? Eu fico pensando também numa universidade que não tem uma diversidade do pensamento. Esse pensamento também vai tornar uma terra improdutiva? Isso é um problema muito forte porque para mim a responsabilidade de questionar o capitalismo não está apenas nos governos em vários países.

Mas está também na mudança de comportamento da sociedade. Porque quanto de nós também nós fizemos a pergunta, quanto de vocês já fez a pergunta: Quantos professores indígenas vocês têm na universidade? Quanto de vocês fizeram a pergunta, também, hoje estaria disposta também de fazer esta pergunta, em quantas indígenas, mulheres indígenas, vocês já votaram? Então, para pensar na mudança também e a desigualdade que acontece, porque a grande explicação para as mudanças climáticas que nós vivenciamos hoje, é porque matou a diversidade. Certamente se nos Estados Unidos tivesse a diversidade que existia antes, de povos indígenas, nós não estaríamos nesse momento do aceleramento das mudanças climáticas. Toda sociedade que mata a diversidade de corpos, certamente, está numa ameaça da monocultura de corpos e do pensamento.

Eu tenho dito que para isso, para reverter esse  processo do aceleramento das mudanças climáticas, não dá para curar o mal com a mesma enfermidade.

Então não se pode curar uma terra com mesmo veneno que fez ela ser morta. Então eu tenho pensado que assim também quando a gente pensa em questionar a estrutura também: da política, dos processos de pensar a questão ambiental tanto no Brasil quanto fora do Brasil; principalmente questionar a exportação que vem em massa e que tem destruído a vida dos povos indígena. Para questionar e fazer uma luta anti sistêmica, eu fico pensando que nós temos de questionar a matriz colonizadora; não exatamente a matriz colonizadora, seria uma patria colonizadora, porque vem do patriarcado.

Então precisamos pensar, quais são as contribuições dos corpos das mulheres? Porque a gente tem falado que o século XXI é  de muitas outras coisas, mas, é principalmente das mulheres e das mulheres indígenas, e é nisso que o fortalecimento das mulheres indígenas evoca as forças da luta porque, quando as pessoas perguntam, constantemente, “O que vocês têm feito para o não-aceleramento das mudanças climáticas?”

Nós temos feito, com nossa própria vida, defendendo o território. Porque nós povos indígenas, eu tenho dito que nós somos o termômetro do mundo. O dia que nós, os povos indígenas parar de respirar no nosso território, toda a humanidade também já não vai conseguir mais respirar. Em vez de responder a essa pergunta, que é tão exaustiva, qual é a contribuição dos povos indígenas, eu tenho dito que nós povos indígenas, as mulheres indígenas, queremos ser reconhecidas na verdadeira importância; porque nós somos as primeiras cientistas. Nós somos como se fosse as doutoras pneumologistas, porque nós cuidamos do pulmão do mundo. É importante fazer essa reflexão porque principalmente quando matou a Paulino Guajajara, como apresentou no vídeo, as pessoas não fazem essa reflexão.

11:00 – 20:00 — transcrita por Alexandra Stephens e Sasha Zeidenberg

É importante fazer essa reflexão porque principalmente quando matou Paulo “Paulino” Guajajara, como apresentou no vídeo, as pessoas não fazem essa reflexão. Pensam que quem sofreu com essa dor da  pena foi apenas os povos indígenas do Brasil, foi apenas o povo Guajajara. Na verdade, assim como no ano  passado foram tombadas 138 lideranças indígenas, a cada vez que tomba uma liderança indígena, são milhões de árvores também, que passam a ser tombadas. Isso atinge a respiração do mundo.

É preciso reconhecer que se as pessoas não sentem sensibilizadas e não estão na luta juntas com os povos indígenas porque pensam que não está sujeitas a morrer pelos conflitos territoriais igual que todos nós povos indígenas estão sujeitos morrer, nós vamos morrer por algo em común, que é o pelo veneno que chega na nossa mesa.

Porque alimentar a ação deveria ser sinónimo exatamente a alimentar o corpo, mas hoje alimentar também tem sido sinónimo de envenenar.

E as pessoas perguntam: “aonde esta luta com o capitalismo começa? Onde o capitalismo começa? O agronegócio começa?” Nós damos de cara com o agronegócio todo dia na primeira refeição do dia. Ela começa pelos pratos que chegam na nossa mesa.

Então, requer  pensar numa luta de sistema mas principalmente numa luta também comportamental.

E pensando nessa questão do capitalismo, no Brasil, semana passada, o governo brasileiro diz que “os povos indígenas querem ser igual a nós; estão passando a ser humano mais evoluído igual a nós.”

E quando faz essa pergunta, eu falo que nós povos indígenas, nós mulheres indígenas, se levantamos muito mais forte agora porque a primeira pessoa que o governo Bolsonaro atacou foi uma mulher. E as pessoas perguntaram, “mas quem foi essa mulher?”

E eu falei, foi a terra. E quando atinge a mulher terra, nós precisamos nos  levantar porque certamente o que está em jogo não é apenas a nossa vida, mas principalmente o nosso modo de vida.

Porque tem matado os povos indígenas não apenas quando tem executado as lideranças indígenas, mas quando executa a nossa identidade, nós já morremos duas vezes.

É importante dizer isso porque, antes, todo o agronegócio, a bancada ruralista, queria apenas executar os corpos indígenas. Assim também como aconteceu também em 1500, hoje apenas com armas sofisticadas.

Mas agora, a arma que tem executado os povos indígenas também tenta matar as nossas vozes.

E não lutar com a mesma arma do inimigo, com o que é a arma do fogo, não significa que nós povos indígenas estão desarmados porque nós lutamos exatamente com a força da espiritualidade que é alimentada pelo território.

E nós falamos que nós desconfiamos de qualquer projeto progresso da morte, de evolução, que não consegue produzir nem seu próprio alimento.

Porque na jornada que nós fizemos, “Sangue indígena, nenhuma gota a mais”, na Europa, as pessoas falaram, é aqui a única fruta nativa daqui é essa porque tudo isso é importado de outros países porque a gente não consegue produzir o próprio alimento.

14:39: Então, quando falo que nós povos indígenas não contribuímos para que o Brasil seja um país de primeiro mundo, nós falamos que é muito mais importante reconhecer que aqui no Brasil nós somos os primeiros, nós somos os originários..

E é por conta desse modo de vida que a humanidade ainda não foi exterminada.

Então é muito importante pensar não exatamente no meio ambiente mas na totalidade da vida, da natureza do território como parte e a contribuição dos povos indígenas.

E nesse sentido, quando nós também questionamos a universidade, o que é ser responsável pelo epistemicídio porque tentaram também matar nosso modo de conhecimento.

E hoje nós chegamos na universidade e as pessoas perguntam, “Como que se sente sendo a primeira indígena a chegar na universidade? Sônia Guajajara, como você se sente sendo a primeira indígena a lançar uma candidatura para ser co-presidente? Joênia Wapichana, como você se sente sendo a primeira mulher indígena chegar no congresso nacional? Mulheres indígenas, como que vocês se sentem?” Nós falamos que nós não sentimos mais importantes por ser as primeiras. Na verdade, nos dá uma responsabilidade redobrada de questionar: “Por que que no pleno século XXI só agora então nós somos as primeiras?”

Então é muito importante fazer essa reflexão porque nós povos indígenas com nossa forma de conhecimento, nós representamos uma forma real de uma epistemologia de cura. Não é apenas o planeta, o financeiro, o que é coisa financeira, não é apenas a política que está em crise. A ciência está em crise.

E nós povos indígenas falamos que nenhum governo, nem projeto de estado, vai conseguir acabar com ciência porque a ciência, ela está, nasce dentro de nós, e nos nossos territórios indígenas. Então nunca vai ser executada.

Nem mesmo fogo que queima Amazônia, nem mesmo fogo que queima o Cerrado e que queimou corpos indígenas em Brasília,  como é o caso de uma liderança indígena Galdino Pataxó, não consegue queimar a nossa memória e a força da oralidade dos povos indígenas.

E é muito importante porque nós falamos que nós mulheres indígenas somos o útero da terra, então quando existe autorização do governo de estado, para flexibilização do armamento, nós mulheres indígenas somos as principais miras, porque certamente  a flexibilização do armamento atinge nossos úteros e o útero da terra, e principalmente compromete as gerações do futuro.

Então para a gente falar de justiça ambiental, de mudanças climáticas, nós temos que entender que hoje a possibilidade, a melhor saída, a grande estratégia está no fortalecimento e na recomendação que demarcar os territórios indígenas não é mais um bem emprestado apenas dos povos indígenas, mas um bem emprestado para a humanidade.

E neste sentido já vou encerrar dizendo que nós povos indígenas fazemos esse levante da luta, e nós mulheres indígenas continuamos a resistir porque nós já decidimos que se for para morrer, que seja porque não estamos falando e não porque permanecemos em silêncio, porque o silêncio historicamente matou muitas mulheres indígenas e continuou matando um  continente inteiro, então é por isso que nós lutamos, para não ter genocídio dos povos indígenas no Brasil, lutamos contra o ecocídio na humanidade, e nós fazemos essa defensa, a partir da ciência do território porque nós acreditamos que nós continuamos a aprender muito mais com árvore  viva do que o papel morto. Certamente o dia que conseguir queimar todos  os papéis, vai ser a nossa oralidade e a nossa memória que vai ter a capacidade de resistir. Obrigada.

Sônia Bone Guajajara:

Olá, gente. Boa noite a todas, boa noite a todos!

(Plateia: Boa noite!)

Aah, boa noite! Bom, eu quero agradecer muito pelo convite, que foi feito para nós, para a gente estar aqui hoje, compartilhando a nossa história, a nossa luta, tudo que a gente vem fazendo no Brasil, uma luta que a gente faz agora, mas que uma luta que já dura 520 anos.

20:00 – 29:00 —  transcrita por Maddie Haines e Emily Jaruszewski

…A gente vem fazendo no Brasil, né, uma luta que a gente faz agora, mas que é uma luta que já dura quinhentos e vinte anos. A nossa presença aqui, a nossa presença no Brasil, já simboliza, né, já mostra a nossa resistência. Porque se não fôssemos um povo tão resistente, a gente já teria sido exterminado, né.

A gente já não existia  mais. Então falar da nossa história é rememorar toda uma tristeza, uma dor, que foi sofrida por todos nossos antepassados, né, por muitos povos, por muitas mulheres que foram estupradas, né, com a colonização, todo o período colonial, com a ditadura, né, para que a gente pudesse hoje se levantar e dizer que a gente já não aceita mais. Nenhum tipo de colonização, nenhum tipo de estupro, e não um tipo mais de imposição,nas nossas vidas. E quando a gente se levanta e segue na luta, a gente não tá trazendo benefício somente para nós. A gente tá trazendo benefício para o  mundo inteiro. Porque a nossa luta, hoje em especial, é uma luta contra esse modelo econômico que é altamente predatório, que destrói toda a mãe terra, acaba com toda a biodiversidade, né, e tenta acabar com a nossa diversidade,acabar com nossos modos de vida. E por fazer essa luta, esse enfrentamento todo, né, a gente é perseguida. A gente é assassinada. A gente é criminalizada, a gente é presa todos os dias.

Porque a luta que a gente faz confronta diretamente o poder econômico e o poder político. E são forças muito poderosas que sempre se articularam junto para acabar com qualquer um que passasse na sua frente.

E hoje nós somos vistos como esse empecilho, esse empecilho ao progresso, esse empecilho ao desenvolvimento. Então a gente segue dizendo que a gente é mesmo contra o desenvolvimento.

Porque o desenvolvimento para nós, ele só serviria se conseguisse trazer as pessoas junto. E o desenvolvimento que se há adotado é uma forma de excluir as pessoas, de aumentar cada vez mais a desigualdade, de colocar cada vez mais quem não tem, sempre quem não tem, né, recursos materiais à margem de todos os processos. E tentam fazer isso com a gente todos os dias. No Brasil, isso  se intensifica com a eleição do presidente Bolsonaro, onde colocam os povos indígenas como seus inimigos número um,colocam mulheres, né, pobres da periferia, negros e negras, né, todos nessa situação de vulnerabilidade.

E a gente segue se articulando porque a gente entende que a luta dos povos indígenas não pode mais ser uma luta isolada.  Nós temos que estar conectados para a gente fortalecer esses que estão sendo, que estão tendo seus direitos retirados, para juntos a gente fazer esse enfrentamento.

A terra hoje se tornou o principal objeto de disputa, o principal objeto de disputa pelo poder  político e pelo poder econômico. E nós fazemos uma luta constante. Não pela terra, mas pelo território. Pela mãe terra porque para nós não é simplesmente dizer terra como um bem físico, um bem que se vende, um bem que se negocia.

Nós tratamos a terra, né, como a nossa mãe. E a gente tem dito sempre para todo mundo, né, quem é aqui que tem coragem de  negociar a sua mãe? De vender a sua mãe? De destruir a sua mãe? Alguém tem coragem? De fazer isso? Não têm, creio que não.

Então nós tratamos a terra com essa mesma relação. Terra para nós é mãe, é que dá vida, é que dá a alimento, é que dá o sustento, é  que dá tudo que a gente precisa. E por ter essa relação como uma relação natural é que a gente não permite essa destruição da mãe terra. E quando a gente luta por um território nós estamos lutando por um espaço que nós também temos essa relação que não é uma relação ali, somente de um  contato, de um lugar para a gente ficar, mas é uma relação também com nossa ancestralidade, com nossos antepassados, com nossa história, e com nossos encantados, que estão ali, que nós protegem), e que nos mantêm sempre nessa conexão, o que dá força para a gente seguir lutando.

E o território para nós é esse lugar, que tem o sagrado, que tem a água, que tem as árvores, que tem os animais, e que tem o ar que a gente precisa para a gente respirar. E é por isso que onde tem a presença indígena, tem território, tem floresta, tem biodiversidade preservada. Onde tem a presença indígena, tem água limpa, onde tem a presença indígena, tem alimento saudável, sem agrotóxico. Então é por isso que a gente segue nessa defesa, porque nós acreditamos que o que nós estamos fazendo é certo. E é por isso a gente não teme de enfrentar nenhum governo. Porque nós não somos obrigados a aceitar nenhuma política injusta,nenhuma lei injusta que venha querer acabar com a nossa vida, acabar com nossa história, acabar com nosso modo de vida. Então nós sempre, né, nós desde mil quinhentos quando os europeus chegaram no Brasil, que o plano de desenvolvimento econômico, ou de desenvolvimento nacional do país sempre teve como base o extermínio dos povos indígenas. Sempre teve como base a exploração dos recursos naturais, né, então sempre teve como base toda essa política de destruição.

E é por isso que nosso povo foi totalmente reduzido, né, de cinco milhões estimados — na escrita, porque a gente acredita que eram muito mais de cinco milhões, né. Hoje no Brasil nós somos menos de um milhão segundo o último censos do IBGE, do instituto de pesquisa. No Brasil nós somos hoje, né, novecentos e dezessete mil indígenas contados. Não sei, deve ter mais, né, eu não fui contada, tu foi contada? Deve ter mais, né. Então nós somos novecentos e dezessete mil, segundo o último censo. Nós conseguimos ainda manter 274 línguas distintas faladas no Brasil, embora tenham  conseguido acabar com muitas, mas nós ainda falamos 274 línguas em todo país.  Nós ainda somos 305 povos indígenas diferentes,trezentos e cinco povos que estão distribuídos nos 27 estados.  E somos obrigadas ainda a escutar todos os dias por onde a gente passa lá que os indígenas do Brasil estão na Amazônia.

29:00-38:00 — transcrita por Amanda Maia e Melisa Aguila Rua

Nos vinte e sete estados e somos obrigadas ainda a escutar todos os dias por onde a gente passa lá que os indígenas do Brasil estão na Amazônia, que só tem indígena na Amazônia. Porque a ideia que se tem de indígena ainda é como um selvagem ou é como ainda aquele que tem que andar nu, que tem que andar no tempo todo caçando e pescando, como que vai continuar caçando e pescando se estão tirando de nós esse direito de caçar, de pescar, de nadar? Nós somos obrigados a nos interagir com outra cultura, a viver uma outra vida que para nós sim essa interação é boa, ela é permitida, é saudável porque a gente tira aquilo que a gente precisa né mas mantém a nossa cultura. 

Agora, o que o governo quer fazer hoje é a tal da integração. Então quando ele fala a integração, ele quer dizer que nós temos que largar a nossa cultura o nosso modo de vida, e nos integrar a uma outra cultura e quando ele fala isso está dizendo que tem uma cultura que é melhor que a outra, uma cultura se sobrepõe sobre a outra e que nós somos obrigados a largar nossa. Que a nossa não presta, que nossa é ruim, a nossa atrapalha e nós temos que aqui adotar uma outra cultura, um outro modo de vida. Então contra isso é também que nós lutamos hoje, contra essa integração que está sendo colocada, enunciada pelo governo Bolsonaro. Além dos 305 povos contatados– claro cada um diferentes níveis; nós temos povos que tem 500 anos em contato com a sociedade não indígena, nós temos povos que têm em média 100 anos de contato né, os que a gente chama de recente contato, nós temos povos que estão totalmente em contexto urbano que vivem na cidade que tá ali mas é indígena e nós temos povos que não tem nenhum contato ainda com a sociedade nem mesmo com nós indígenas que estamos ali no mesmo território. 

Já são confirmados 114 grupos de povos que vivem em isolamento voluntário que o estado insiste em chamar de povos isolados e nós chamamos de povos autônomos porque eles estão ali por decisão própria por escolha deles porque se eles quisessem o contato eles já teriam se aproximado eles já teriam vindo procurar ajuda, então nós temos que respeitar essa decisão deles. O que nós temos que fazer é lutar pela garantia do território para que eles possam continuar ali para que eles possam continuar com seu modo de vida. Então, por isso nós também fazemos essa luta por eles que não estão para poder falar e exigir essa proteção do território. Então tudo isso faz com que, a gente faça essa luta constante contra a exploração ilegal de madeira nos territórios indígenas, contra a exploração de minério nos territórios indígenas, contra a expansão agrícola do agronegócio por meio das monoculturas que é o que todo dia nós estamos agora né tendo que assistir medidas no Congresso Nacional que se tenta aprovar leis para autorizar o desmatamento para a expansão agrícola. Então nós fazemos essa luta que não é pouca, não é pequena, porque a gente mexe com o governo e a gente mexe também com os grandes empresários e quando a gente aqui o governo e empresários nós estamos lutando também contra esse poder econômico que tenta todo dia mostrar que tem que se enriquecer, que tem que ter mais lucro, que essas empresas têm que explorar mais porque têm que aumentar a produção para o crescimento econômico e aí com isso faz com que as pessoas também estão entendendo que o mais importante mesmo é o produto interno bruto, é o valor do PIB, é o valor da bolsa. As pessoas seguem acreditando que o país está bem quando a bolsa está bem quando o PIB está bem e poucas pessoas se perguntam…

… quantas pessoas estão deixando de ter acesso ao alimento por conta dessa expansão agrícola para atender às grandes empresas, para atender aos commodities? Quantas pessoas estão deixando de ter acesso a água limpa por conta da exploração de minério e esse minério contaminou a água, que passa no seu território, que passa na sua cidade? Quantas pessoas olham para os rios poluídos nas ruas das cidades, seja em que lugar for, e se comovem com isso? Quantas pessoas olham aquele rio e imaginam que ele poderia ser um rio limpo para todas as pessoas ter acesso? Quantas pessoas se comovem quando veem os governos, o poder público destruindo, cortando as árvores da sua cidade para fazer uma praça, para fazer um estacionamento? Quantas pessoas se comovem ou se sentem também responsáveis para lutar contra isso? 

Então, muitas pessoas, e a gente mesmo que está aqui, a gente sempre pensa que as respostas estão nas altas-tecnologias para resolver a crise econômica, para resolver as mudanças climáticas, muita gente espera sempre que as altas-tecnologias vão resolver. Mas a gente sempre se pergunta, né, qual é o novo ser humano que a gente quer para resolver tudo isso? O que tem que se fazer para a gente ter humanos que possam se perceber também responsáveis, para conter essas mudanças, para conter as mudanças climáticas. O que que se tem que fazer para descarbonizar as mentes dos governantes, mas também restaurar o coração das pessoas. Como cada um se percebe dentro dessa luta? 

A cada dia falam para nós novas palavras. Eu venho lá da aldeia, eu venho da terra indígena Araribóia. Até quinze anos de idade, eu nunca tinha ido a uma cidade. Eu nunca tinha visto um posto de luz elétrica. Até quinze anos eu nunca tinha visto asfalto. E eu fui para a cidade grande porque eu sempre tive vontade de ir. Desde menina eu queria, eu sonhava em sair, eu sonhava em viajar, porque eu sabia que se eu continuasse ali naquele meu lugar daquele jeito, eu ia ser como todo mundo. E por mais que eu gostasse do meu lugar, de estar perto da minha família, mas eu me sentia muito inquieta. Porque eu sabia que eu ali, eu não ia poder ajudar, não ia poder modificar ninguém, porque eu também estava aceitando sempre as mesmas coisas. E eu sempre quis sair, sempre quis conhecer o mundo. E eu conheci o mundo mesmo antes de sair para ele porque eu lia muito e eu já via as histórias. Então, quando eu vim para os Estados Unidos, pela primeira vez, parecia que eu já conhecia tudo, porque eu já conhecia muito dessa história, inclusive do extermínio dos povos indígenas nesse país, como o governo tratava os povos indígenas aqui. Então, quando eu saí, eu descobri que tinha muita coisa, muita coisa para ser feita, para se mudar, e que eu não ia conseguir fazer isso sozinha. Que a gente tinha que juntar mais gente, que a gente tinha que trazer mais pessoas. E foi com esse sentimento de que muitos povos indígenas ainda não tinham sua terra demarcada, é que eu me propus a organizar coletivos e a gente fortalecer o movimento indígena e emplacar essa luta em defesa dos territórios. E nós seguimos, a partir do movimento indígena no estado, na região, nacional, e hoje a gente chega no internacional…

38:00 – 47:00 — transcrita por Isabel Teixiera e Michelle Tsai Gomez

E nós seguimos, né, a parte do movimento indígena no estado, na região, nacional, e hoje a gente chega no internacional falando da presença indígena e do sentido do nosso modo de vida. Nós somamos hoje cinco por cento da população mundial, nós indígenas no mundo inteiro, né. Nós somamos cinco por cento da população mundial. Esse cinco por cento consegue proteger 82% da biodiversidade viva que ainda existe no mundo. 82%!

Nós ainda conseguimos proteger a maior parte da água doce que há no planeta, né, que está na Amazônia. O Brasil tem outros dois maiores aquíferos de água, né, um na Amazônia e outro no sul e sudeste, e onde estão esses aquíferos tem a presença, né, e tem esses territórios indígenas. E aí as pessoas perguntam para nós, e lá no Brasil em especial, “Nossa, esses índios têm muita terra. Para que que os índios querem tanta terra?” Né? No Brasil nós somos menos que 1% da população do país. Menos que 1%. Nós ocupamos 13% do território nacional. É muito? Vocês acham muito? Parece muito, né?

Os ruralistas dizem todo dia para nós que é muito. Todos os dias eles dizem que é demais, Bolsonaro está dizendo que a gente não precisa dessa terra, que a demarcação da terra no Brasil é abusiva, né? E aí quando você faz a conta aoinverso, né, você vê que um por cento, um por cento da população, né, ruralista, eles detêm 46% da propriedade rural. Quarenta e seis por cento eles têm, e como é que esse número não é grande? Não é muito, para o mesmo um por cento, né? E aí você pode comparar e olhar, né? O que é que tem na terra indígena nesses treze por cento? Que é que tem aqui na terra indígena? Alguem pode me ajudar? A imaginar e lembrar? Que é que tem aqui?

(Plateia: Floresta)

Tem floresta.

(Plateia: Biodiversidade)

Biodiversidade.

(Plateia: Rios)

Água limpa as nascentes. Está tudo aqui nesse 13%, mais é pequeno, é pouco.

Nesses 46% aqui, você vê o quê? Você vê o quê? Gado, soja, eucalipto, cana de açúcar, né. Você vê que há as monoculturas. E agora a gente pode comparar esse lado com esse lado aqui. O que cada um oferece para o planeta, né? Esse aqui tu pega o eucalipto, ele vai sujar a água onde ele está né, traz para ele, e seca tudo quanto é nascente, seca tudo quanto é rio, igarapé, e riacho. E aí você pega a produção de soja. O que que ela oferece? Veneno. Agrotóxico que todo mundo que está  em volta é contaminado por esse veneno,que é ali aplicado. Hoje no Brasil se aplica de helicóptero, joga de cima e atinge todo mundo que está: as pessoas, a água, tudo que está ali, né?

E aí você vem aqui de novo para a terra indígena, o que é que a gente tem? A floresta em pé, que garante, a regulação da chuva, que manda a chuva para todo lugar. As floresta em pé que segura o carbono, né, o gás carbono que era para ser jogado para a atmosfera está ali, guardado. Evitando ainda que esses gases sejam emitidos, e ainda consegue equilibrar, né, todo o oxigênio, que joga né, não só lá mas para o mundo todo, como é global né,  circula, roda, chega para todo mundo, né.

Então nós precisamos dessas florestas em pé,para garantir o ar. Essa ali falou que nós somos os pneumologistas do mundo, que nós temos o maior pulmão do mundo. Todo mundo olha para a Amazônia, todo mundo olha, mas a maioria das pessoas que olha a Amazônia olha ali as floresta, o verde, e até os bichos né? Mas pouca gente olha que tem gente lá também. Pouca gente imagina que somos nós ali com nosso modo de vida, que garante ainda esta floresta em pé,que garante a proteção dessa biodiversidadedesse lugar. Poucas pessoas conseguem saber que somos nós, com nosso modo de vida, é que está sustentando ali.

E a gente sustenta como? Sustenta, com essa luta que a gente trava todo dia, lá na porta do Congresso Nacional,levando bala de borracha, levando o spray de pimenta, né apanhando da polícia, sendo preso. Mas a gente vai para lá. Então nós estamos pagando com as nossas próprias vidas.

Para a gente pode manter ali ainda viva essa biodiversidade. Então é por isso que a gente não aceita que as pessoas olhem para a gente, e fiquem com pena. A gente não quer que ninguém tenha pena de nós. E não olha para a gente como coitadinhos, ou como selvagem como Bolsonaro diz, ou como não humanos como ele diz também, né?

Mas a gente quer que as pessoas olhem para a gente, pela potência que nós somos, para garantir a vida no planeta, para garantir a água que chega para todo mundo, a água limpa, a chuva, o ar que todo mundo respira. É claro que a gente sabe, nós estamos contando o que é da nossa parte, do que a gente faz, do que a gente proteja, da luta que a gente trava, né? É claro que tem outros e outros fatores que ajudam a garantir esse equilíbrio, que ajuda a regular chuva, mas nós aqui também somos uma parte dessa potência.

E nós estamos sempre falando para as pessoas que não é nós que somos parte do Brasil. O Brasil é que é parte de nós. Que nós somos os primeiros ali. O Brasil é parte de nós. E nós queremos sim fazer essa disputa, essa disputa pelo Brasil. Essa disputa pelo nosso lugar. E a gente faz a disputa. Assim. Na luta política, que a gente faz todo dia, mas a gente está fazendo também essa disputa, né, de narrativa, nas redes sociais. Se a gente tem internet hoje, se tem acesso também né a esse meio de comunicação, nós temos que utilizar dele também, para poder dar visibilidade para a realidade indígena. O que que a gente faz, e o que que a gente precisa que as pessoas façam para estar junto  com a gente. Se as pessoas não conhecem as pessoas não se aproximam. E muita gente olha para nós, no governo olham para nós como empecilho, olham para nós como inimigo, mas muita gente também olham para nós ainda como selvagem.

E aí não se aproximam, têm medo, não querem saber, não querem conhecer, e por isso esse distanciamento. E por esse distanciamento há muita desconhecimentodas pessoas sobre a vida dos povos indígenas,no mundo inteiro. E as escolas que deveriam adotar, né, materiais para poder trabalhar com os estudantes né, em todas as séries, também se isentam disso. Né, e aí você vê que as pessoas chegam aos quarenta anos ou cinquenta anos e não sabem nada da realidade indígena, né? Então uma das formas da gente poder né, das pessoas poderem conhecer melhor a gente seria os estabelecimento de ensino desde as primeiras séries, adotar também essa disciplina, né, não que a gente seja disciplinados assim.

47:00 – 51:00 — transcrita por Emilia Tamayo

Adotar disciplinas que falem dos povos indígenas. Né? Quantos são? Como vivem? Onde estão? O que que fazem? E principalmente, falar dos conflitos existentes. Não é mais falar hoje dos povos indígenas com aquele  romantismo que se falava no passado. Né? Os povos indígenas ou o indígena ou a indígena bonita dos romances. Tem que mostrar os indígenas hoje como é, os confrontos que a gente trava, os conflitos que é colocado, nem toda essa luta política que a gente faz, para a gente continuar existindo.

Então, hoje nós indígenas, nós seguimos, na linha de frente, nessa luta. Na linha de frente contra esse modelo econômico, totalmente predatório. Na linha de frente contra as mudanças climáticas, era esse o tema, não era? Contra as mudanças climáticas, mas é porque é isso nosso próprio modo de vida já é, né, por si só o enfrentamento às mudanças climáticas, né? No ano passado, nós realizamos no Brasil a primeira marcha das mulheres indígenas. Né? E muita gente pergunta, “Mas porque só vieram agora? Porque vocês chegaram? Não, né, a gente não chegou só agora.  Há 500 anos a gente luta contra tudo que tá aí. Só que chega uma hora que a  nossa luta local não é mais suficiente. E nós temos  que se levantar e chamar mais pessoas para dar as mãos.

Então, nós chegamos em Brasília no ano passado, em agosto, no Dia Internacional Dos Povos Indígenas, e nós reunimos ali mais de três mil mulheres, que saíram de seus territórios, todas deram seu jeito de sair e chegar, muitas enfrentaram seus companheiros para poder vir. Né? Porque além da gente fazer esse chamado, nós temos ainda que mostrar para nosso povo, que a não permissão da participação das mulheres não é cultural. Não é cultura ter essa subserviência, não é cultura. Né? Você, não é cultura, você ficar ali à margem. Isso é herança colonial. Isso faz parte de todo o processo de colonização que a gente viveu, e que nossos povos também aderiram. Há um tipo de machismo, há um tipo de violência doméstica, e há um tipo de proibição das mulheres de não participarem.

Então, nós temos que romper também com essa barreira. Né? Essa barreira colonial, machista, que por muitos povos ainda é visto como cultura. E nós temos que fazer esse enfrentamento. E nós conseguimos trazer três mil mulheres para Brasília, realizamos a primeira marcha, né? E cada uma que veio ali voltou sabendo que não voltou mais a mesma. Elas falaram, né, “Eu quero estar junta, eu quero continuar, eu quero participar, eu sei que essa luta depende de nós.”

Então, essa marcha foi muito importante. A primeira marcha das mulheres no Brasil, mas é a primeira marcha das mulheres indígenas do mundo. E, como continuidade dessa marcha, nós vamos realizar esse ano a caravana de mulheres indígenas pelo Brasil. Aí nós vamos circular todos os estados brasileiros, reunir com mulheres de todos os povos, de todos os territórios e nós vamos  discutir exatamente o tema dessa palestra.

51:00-55:00 — transcrita por Yesenia Villatoro Ramirez

O papel das mulheres indígenas para conter as mudanças climáticas. E nós vamos também, ainda, discutir e impulsionar as candidaturas das mulheres indígenas. Porque esse lugar na política institucional é nosso também.

Nós temos hoje uma mulher deputada federal eleita na eleição  passada, mas uma só é pouca. A nossa luta é coletiva, e onde tem uma, nós temos que levar mais. Então, nós vamos  impulsionar a candidatura de mulheres indígenas para ocupar também todos os níveis da política institucional, desde  do seu município, ao seu estado, e ao nacional, e até a presidência, né? A começar. Vamos seguir. Então nós vamos realizar essa caravana de mulheres pelo Brasil, e em setembro, dia cinco de setembro, que é dia internacional da mulher indígena, nós vamos realizar esse encontro internacional no Brasil. É o chamado das mulheres indígenas do Brasil para as mulheres do mundo. Para que outras mulheres também possam se somar  a nós, porque não estamos dizendo essa luta não é só nossa, nós não estamos mandando conta de carregar essa responsabilidade sozinha.

Outras mulheres também têm que chegar junto, e têm que assumir também essa responsabilidade. E se nós estivemos até agora, ali, fazendo essa luta, né, no nosso lugar, nós queremos agora internacionalizar. Globalizar também a nossa luta. Não é só o mercado que tem que ser globalizado, não. Nós temos que inclusive nos organizar globalmente para poder trazer o mercado para o local.

Nós não podemos mais permitir que esse modelo econômico com base no agronegócio nas monoculturas, siga reduzindo a produção da diversidade de grãos. Porque da forma que está hoje, esse modelo da monocultura, o agronegócio, ele reduz entre 25 a 30% a produção  de grãos, que é de verdade o que a gente come. Que é o nosso alimento. É mais do que isso, está mais comprovado que 80% da alimentação no mundo é produzido pela agricultura familiar.

No Brasil, 70% da alimentação que vai para a mesa das pessoas é agricultura familiar. Então, nós temos que seguir lutando pela descentralização do uso da terra. E com isso, diversificar a produção dos alimentos, e quem é que vai fazer isso? São  os grandes empresários? Não é. Quem vai fazer isso somos nós. É o trabalhador rural, é o pequeno produtor, nós indígenas, os quilombolas, comunidades tradicionais. Somos nós que vivemos e dependemos desse território. Que temos o nosso território como esse lugar de plantar, de viver. Não como eles que têm a terra para eles como um mercado, como um bem para negociar. Então nós temos que seguir lutando por essa relação e para isso mais pessoas têm que chegar juntas. Têm que estar entendendo. Têm que se reconectar com a mãe natureza. Têm que entender que é exatamente essa conexão é que vai garantir o nosso futuro. Nós não temos plano B. Nós não temos planeta B. E o nosso caminho é a luta. Muito obrigada.

By Alex Stephens

I'm a human being from Earth as far as I know.